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segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

15ª parte - Precisa ser diferente para valer a pena viver

Mudanças

            A casa estava estranha, faltava alguma coisa, olhou nos quartos, na cozinha e parou na sala, pelo vidro da janela conseguia ver uma árvore e entendeu que não faltavam coisas na casa dela. Era sua família que há muito tempo, sem querer, ela entendia, havia abandonado os sonhos.
            Ela tinha vivido momentos extraordinários, naquele final de semana e agora estava em casa, sozinha como sempre procurando algo. Sabia que era hora de dormir, tinha definido em seus planos, na sua mente, na forma como entendia as coisas que se obedecesse e cumprisse com seus deveres conseguiria tudo o que desejava.
            Compreendeu naquele momento que isso não bastava, queria muito conversar com os pais, mas com certeza estariam trabalhando ou com alguns amigos. Foi engraçado quando se deu conta, de que havia acontecido algo maravilhoso consigo, mas nem passaria pela cabeça dos seus pais. Eles nunca sabiam de nada novo que acontecia com ela.
            Ainda estava em pé na sala quando alguém abriu a porta. Olhou rapidamente e se sentiu desconfortável, parecia que estava fazendo algo errado. Era sua mãe.
            - Maria. Está tudo bem? Miriam perguntou assustada, geralmente esse horário ela estaria dormindo, o que estava fazendo ali na sala.
            - Tudo bem, mãe. Por quê? Perguntou tentando parecer segura e para que a mãe entendesse que seria normal ela ficar na sala. Qual o problema? Só que ela estava com medo. Não conseguia sustentar um olhar por muito tempo, e sedia as pressões dos seus pais.
            - Achei estranho te encontrar a essa hora acordada.
            O olhar da mãe deixou Maria sem resposta, então foi para o quarto sem dizer nada.
            Ela gostaria de voltar e contar tudo para a sua mãe, de falar o que estava sentindo e como sentia falta dela, até foi à porta ficou parada por uns instantes, ouviu a mãe arrumar algo para comer e ouviu o pai chegando mais tarde... foi para o quarto.
Ligou o computador e entrou no facebook, viu que tinha uma mensagem in box.
- Leo?
“Oi Maria, tudo bem? Eu sou o Leo, seu amigo de classe. Nós conversamos no shopping na semana passada. Me add, please. Bj”
Ela ficou interessada, o Leo era bonito, inteligente, tinha gostado de conversar com ele, mas ele também era muito fechado. Adicionou ele no face e respondeu a mensagem.
“Oi Leo, eu estou bem. Já te add. E você, como está? A gente se vê na escola. Bj”.

            De manhã ao acordar estava tudo pronto, sua mãe ainda estava dormindo, seu pai já tinha saído para trabalhar e seu café estava lá, no mesmo lugar. Quem fazia o café para Maria era o seu pai que deixava na garrafa térmica para não esfriar, tinha dois pães, ela sempre comia metade de um e sabia que sua mãe comeria o outro.
            Naquele dia teve coragem de escrever um bilhete para sua mãe.
            “Bom dia!
Sei que você trabalha muito, mas gostaria de um tempinho com você e com o papai, faz quase um ano que não saímos juntos.
Estou com saudades.
Beijos,
Sua filha”

            Ela foi até a frente do condomínio esperar a condução que a levava para escola e foi sorrindo, feliz consigo mesma por ter escrito um bilhete para sua mãe. Quando chegou a escola a primeira pessoa que ela viu foi a Juliana que por sinal estava com um sorriso radiante, até parecia que estava a frente do colégio esperando-a chegar.
            - Como você está?
            - Poderia falar oi, primeiro...
            - Oi Maria. Tudo bem? Juliana falou com um tom de deboche.
            Maria fez uma careta como alguém que não gostou muito do que ouviu e sorriu para a amiga.
            - Eu estou bem.
            - Só, está bem. E o que aconteceu esse final de semana, não vai me contar como foi na sua casa...
            Maria ficou triste, chateada. Juliana entendeu tudo, ela também não conseguia conversar com os pais. Ela explicou que com ela foi assim também e contou sobre a conversa com eles no domingo a noite, como foi bom e que estava feliz.
            - Como eu gostaria de conversar mais com meus pais, ou melhor, conversar pelo menos um pouco com eles. Estão sempre ocupados, trabalhando. Só conversamos quando algo fica muito sério, para resolver alguma coisa, geralmente comigo.
            - Não fica chateada Maria, aos poucos tudo vai mudar.
            Maria sorriu e disse que já estava mudando, pelo menos com ela, pois tinha conseguido deixar um bilhete para sua mãe. Juliana a abraçou toda eufórica e disse que ela mandou muito bem. E daí, tocou o sinal para entrarem na sala.
- Tenho algo para falar com você.
- O que é?
- O Léo me chamou no face.
- Sério?
- Pediu para eu adicionar ele, perguntou como eu estou...
- Hummm, ele é um gatinho. De todos os meninos da sala ele é o mais gato, e ainda mega inteligente, amiga.
- Ele é bonito mesmo, você precisa ver as fotos dele no face, uau.
- (risos) Eu quase nem entro no face. Arrasando corações hein. Cuidado para o Daniel não ficar com ciúmes.
- Vai sonhando.
            A semana na escola foi agitada. Juliana e Maria conversaram bastante com a Bia, que também havia estado na praça assistindo a peça de teatro. Bia estava feliz com tudo o que tinha acontecido, disse que tinha conversado com seus pais sobre tudo que tinha visto e ouvido, a mãe ficou feliz, mas o pai não deu muita bola para o assunto. A Bia sempre foi muito engajada em obras sociais, atenta as necessidades das pessoas, e em relação a esse assunto muito discreta, ela gosta muito de conversar, falava sobre filmes, sobre as pessoas, era direta. Ela já frequentava uma igreja, e cuidava para não decepcionar o seu pai que era muito tradicional. Ela gostou muito da peça, da maneira como apresentaram, da alegria das pessoas, mas apesar de estar animada não estava tão firme e convicta de estar junto com a turma da Juliana quanto a Maria. Ela pensa diferente.
            As três começaram a ficar juntas no intervalo, conversavam bastante e a Bia tentava trazer a Bruna para perto, mas ela não estava gostando da idéia de ficar perto da Maria e muito menos da Juliana que “bancava uma certinha”, ela tinha outros planos.
            Daniel ficou distante o tempo todo, quieto, mal cumprimentava, os meninos brincavam com ele, mas ele não ligava. “Não tava a fim de brincadeira”, era o que ele respondia para os seus colegas que estavam acostumados e “zoar” com a fama de “pegador” dele. Por muitas vezes Maria olhava para ele, só que era outro olhar, de dúvidas e decepções, estava decepcionada com a conversa que tinha ouvido no shopping, quando estavam entrando no cinema e suas dúvidas eram, se ele ia à igreja, era filho de pastor, por que não era igual a Juliana.
            E o Léo estava tentando se aproximar da Maria, sentou-se ao lado dela na sala, perguntou sobre algumas matérias e até arriscava algumas brincadeiras. O Léo aproveitou a distancia do Daniel para falar que não ia muito com a cara dele e que achava ele falso, pois ia a igreja e aprontava muito.
            Maria começou a ver o Daniel como um mau caráter. Um hipócrita!
            Na verdade Daniel estava passando por uma avalanche de sentimentos confusos e também estava com dúvidas. Ficou sabendo pela mãe que Maria tinha ido à igreja e ficou aliviado por não ter ido aquele dia. Tinha que conversar com alguém, só não sabia quem.
            Mas foi Maria quem deu a idéia para Juliana se aproximar do Daniel, apesar da recusa, mas com a insistência de Maria. Ela foi.
            - Oi Dani! Aproximou-se dele, sentou-se ao seu lado.
            - O que você quer Juliana? Algum recado? Ele nem olhou para ela.
            - Não Dani. Nenhum recado. Eu quero saber por que você está assim? O que está acontecendo? Falou rápido e brava, já se arrependendo de ter ido conversar com ele.
            Ele ficou em silêncio, não olhou para ela, fitava qualquer coisa no chão. Ela ainda ficou algum tempo ali. Até porque, já que tinha ido até lá, não iria desistir facilmente. Então quebrou o silêncio.
            - Eu vou embora Dani, eu sei o que aconteceu com você esse final de semana, sei que ficou de castigo, e por isso não foi ao shopping, fique tranqüilo não contei a ninguém. Gostaria de te ajudar, assim como você me ajudou, mas se não quer conversar, eu não vou insistir. Quando precisar sabe que pode contar comigo.
            Ela estava se levantando para ir embora.
            - Ju, fica aqui mais um pouco. Disse com uma voz rouca e pausadamente.
            Ela voltou se sentou ao lado dele e ficou esperando.
            - A Bruna mandou recado falando que quer ficar comigo...
            - Eu tenho certeza que não é isso que esta te deixando preocupado e insuportável, você vai falar sério ou não?
            Ele deu risada.
            - Não, não é, até porque problemas com meninas lindas, eu nunca tive. Falou dando risada e debochando da Juliana. Voltou a ser o Daniel de sempre.
            - Dani, você vai falar algo sério ou não. Ela já estava impaciente.
            - Até gostaria Ju, mas agora não tem como. Podemos conversar depois da aula, você vai ficar aqui na escola?
            - Não iria, mas...
            - Mas então você vai ficar, por favor, preciso conversar.
            - Esta bem. Ela deu um beijinho nele e foi para a sala. Maria já estava lá e quando a amiga entrou a encarou com um olhar de interrogação, mas logo atrás dela entrava o Daniel.
            Em todas as aulas o Daniel estava compenetrado, ouvindo tudo, tirando dúvidas. O pessoal da sala não agüentou e começou a tirar sarro.
            - O que aconteceu com você??? Virou nerd?
            Ele rebatia as brincadeiras.
            - Só estou tirando dúvidas, quero aprender, qual é o problema?

            A sala deu risada e o professor continuou com as explicações.

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